“A vida não tem preço.” Autor desconhecido.
Poucas são as coisas e situações que eu não consigo mensurar valor. Estou tentando lembrar delas, e a maioria das coisas que me vem na cabeça não consigo atribuir valor por ser algo inestimável e subjetivo porém em todas elas eu consigo comparar com algo.
Não consigo encontrar metáforas e comparações para valorizar a sobrevivência.
Simplesmente sobrevivo, e continuo sobrevivendo, encontro infinitas formas, aprendizados, desafios quase intransponíveis e em todos os obstáculos a máxima é continuar.
Nunca fui muito dos esportes radicais, mas já saltei de paraquedas e de asa-delta, já andei em algumas tirolesas incríveis e montanhas russas também. A adrenalina vai no pico nestas distrações, e talvez ela seja um ingrediente interessante na valorização da vida ou da sobrevivência. Penso naqueles indivíduos que vivem o limite, numa escalada ou numa aventura por exemplo em que o risco é incalculável e o limite da sobrevivência é extremo. Se desafiam a entrar em enrascadas para testar sua sobrevivência, parece louco, mas cada um com suas escolhas sobre o que te move, o que te fascina e o que te causa emoções positivas.
Tirando de contexto os desafiantes da vida, como olhamos para a sobrevivência que não temos escolha. Sim um montanhista ou paraquedista escolhe o risco ao testar sua sobrevivência. Mas e aqueles que não puderam escolher, que de repente se encontram em meio a uma guerra, ou vieram ao mundo em um cenário de escassez extrema, pobreza e violência, como é sobreviver neste cenário extremo de não escolha?
Me recordo das interações que tive com 4 moradores de rua no inicio de 2019 na Simplify, aprendi muito com eles e suas percepções distintas da sociedade que vivemos. Segundo eles quando você está na rua, não existe mais nada a perder, não se tem nada, quando se tem são alguns pequenos objetos que a qualquer instante podem ser tirados de ti, com isso se habituam a não ter nada, não ter o que perder. Nesse limite extremo, o que eles tem e começam a valorizar cada vez mais profundamente é a vida. A tarefa diária é sobreviver, buscar o próximo prato de comida e continuar. Em alguns relatos ouvi histórias de caminhadas, sentindo frio, na chuva, e sem encontrar uma solução aparente, a solução era continuar caminhando para manter o corpo aquecido até encontrar uma oportunidade de solução.
Nesse cenário de sobrevivência, segundo eles, o cérebro perde o foco para todo o resto, a cabeça gira e trava olhando para imagem, o calor, ou o saciar de fome. Alguns se desesperam, outros encontram na droga o alivio, para continuar caminhando, e se perdem na própria caminhada.
Quando se chega nessa profundidade, a sobrevivência perde comparação de valor e ganha dualidade de apenas viver ou morrer, 0 ou 1, sim ou não. As histórias se multiplicam, os cenários aterrorizantes aumentam, a insegurança se torna insuportável. E ainda assim a sobrevivência está ali disponível.
É complexo eu tentar falar de sobrevivência do meu posto assalariado, com saude, família saudável, com lugar onde dormir e me divertir, e uma formação de alto nível que me permite valorizar ou criar valor com o que interajo. É difícil eu falar de algo que não vivi, não experimentei essa sobrevivência assustadoramente arriscada. Experimentem em outros níveis, nas prisões da minha mente de não encontrar soluções para embotamentos e aprisionamentos severos, mas ainda assim tinha o que comer e onde dormir.
Volto ao foco da pergunta sobre valor, e me debato em entender que as coisas mais importantes da vida talvez não sejam valorizadas, não por ma vontade, é por que simplesmente são, e assim passamos a distanciar e separar as pessoas uma das outras em grupos que nos agradam e não nos agradam, sem se importar em saber como e com que histórias sobrevivem. Afinal somos todos sobreviventes e corremos riscos severos em algum momento da nossa vida, só não conseguimos compara-los por que efetivamente a sobrevivência não pode ser comparada, só percebida e sentida e somente eu em silêncio posso atribuir o meu valor a ela, e somente ela, a minha sobrevivência.
Será que a espontaneidade é consciente?
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